Hoje, sem dúvida, temos melhores condições de vida. Casas bem construídas, uma série de eletrodomésticos, passeios, boa alimentação e um carro. Falo de nós, pobres. Os ricos sempre tiveram tudo isto, é certo que alguns por avareza, levam vida de miseráveis, mas esta é uma outra história. Há, no entanto, areia nesta engrenagem.
Os trabalhadores, em geral, de vinte ou quinze anos atrás quando deixavam o tabalho ao final do dia, com raríssimas exceções, não eram incomodados em casa ou no barzinho no happy hour. Iam pra casa, tomavam seu banho tranquilo, pelo menos os mais asseados, jantavam, assistiam tevê com a família e iam dormir. Só lembravam do trabalho quando nele chegavam. Os finais de semana e feriados eram mais tranquilos ainda, nem em sonho imaginavam receber uma ligação do patrão ou um telegrama sobre problemas no trabalho.
Aí chegou o celular, primeira camada de areia na engrenagem da tranquilidade, o pobre coitado começou a ser localizado nos locais menos prováveis, da igreja ao motel, quebrando toda sensação de descanso. O cara, numa boa, na mesa de um bar e, de repente, o celular toca, ele atende e, sem um boa-noite, "Venha pro escritório agora, precisamos conferir o estoque!".
Com o telefone celular, num mesmo pacote de presente, vieram as mensagens, "onde você colocou a nota fiscal da dona Isabel?" "Qual a senha para acessar o cadastro dos clientes de Bauru?". O funcionário, agora chique porque tem um celular, trabalha sem perceber e, o pior, sem nada a mais receber.
Então veio o pior, um tal de e-mail, o sofredor está em casa brincando com o filho de cavalinho, os pais ainda brincam assim? Imaginemos que sim, pode ser? Pois bem, no meio da risada gostosa do filhão um apito vindo do notebook. Fazer o quê, põe a criança no sofá, abre seu e-mail e naquela tarde de domingo lê "Sérgio, faça um relatório sobre o expediente de ontem aqui na loja e me envie em uma hora, o Dr. Eduardo precisa destas informações com urgência, pois considerou o faturamento fraco e estuda a possiblidade de despedir alguns funcionários!".
Agora o fechamento com chave de ouro, o celular, a mensagem, o e-mail, por incrível que pareça, são sinônimos de status, o trabalhador sente-se importante utilizando-os, não tem, na maioria das vezes, consciência, que na verdade está trabalhando mais, não descansa, dá mais lucro para o patrão e não recebe nada a mais por isso.
Enfim, até que acordemos estaremos em um novo ciclo de exploração de mão de obra, com cara moderna, mas com evidentes sinais de subserviência e de trabalho escravo. Quem poderá nos salvar? Poderá a nossa célere justiça regulamentar esta nova relação de trabalho? Como poderemos ser salvos, se o inferno das modernas tecnologias nos aprisiona em suas teias disfarçadas de tecnologia do futuro?
Adalto Paceli