sexta-feira, 27 de dezembro de 2024

 

Conversa vai...

Às vezes os assuntos mudam de rumo, numa consulta médica é raro, mas indo num dia atípico quando o Doutor está “de boa” como aconteceu comigo esta probabilidade é maior. Só sei que foi assim...

Quando demos por nós estávamos conversando sobre literatura, até aí tudo bem. Falei de minha dificuldade para entender Nietzsche, sugeriu que começasse pelo Genealogia a Moral, questionado se havia lido Zorba, o Grego, um dos meus favoritos, disse que não...

Fomos para filmes, comentei sobre um mexicano, Pedro Páramo, anotou, fiz um paralelo com Cem Anos de Solidão do Gabriel Garcia Marques, ambos na NetFlix e pertencentes ao Realismo Fantástico e  releituras de livros. Até aqui, embora estivéssemos numa consulta médica, nada de tão anormal assim, pois médicos também não leem só assuntos diretamente ligados à sua profissão, penso eu.

O inusitado foi quando comentei apenas isso: “tem uma escritora de Belo Horizonte...” E o Dr. Moacir sem pestanejar respondeu “A Carla Madeira!” E seguidamente mencionou seus três grandes sucessos de vendas: Tudo é Rio (2014), A Natureza da Mordida (2018) e Véspera (2023 – 14ª Ed.) Fiquei impressionado, então conversamos sobre a qualidade excepcional da escrita dessa escritora mineira, que mistura dor com leveza, pessimismo com otimismo nos dramas do cotidiano.

Animado, terminada a leitura de A Divina Comédia, amplamente comentada nesse espaço, tomei do livro, gentilmente cedido pelo amigo Fernando e começamos a ler.

Ficam aqui as dicas.

Adalto Paceli de Oliveira


 


quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

 A Divina Comédia II

1324 – 1321- Período de escrita
É chegado o momento do encontro com a amada Beatriz, não só de júbilo e doces palavras, mas de reprimenda, pois sua amada o relembra seu mau proceder, evidenciando o motivo da licença especial para que Dante em vida entre no Reino dos Mortais e antevendo as agruras que o aguardam, mudar seu proceder.
Chegando aos vários espaços do Paraíso, etapa final desta viagem, desse clássico da literatura universal, destacamos além da poesia, outro aspecto já citado no texto anterior: https://www.facebook.com/share/p/1Dtf5Yqe8K/ e alguns ainda não mencionados.
Reiteramos as metáforas, Figura de Linguagem utilizada no transcorrer da narrativa: “Pois assim como o Sol ofusca mais fortemente a vista menos robusta, ao grato memorar daquele doce sorriso (de Beatriz) a minha mente se debilita e prostra.” Nesse exemplo temos também outro recurso poético, a Hipérbole, ou seja, o exagero intencional.
Os capítulos são breves e denominados Cantos, pois originalmente trata-se de um poema Épico-Teológico, por ser longo, evocando elementos e personagens bíblicos.
Uma heterodoxia é o envolvimento desses elementos com a Mitologia Greco-romana, “Do mesmo modo vi o fulgurar de Júpiter, que tempera o frio do pai (Saturno) e o calor do filho (Marte).”... “E tal qual o bom senhor que atento e contente ouve seu servo transmitir-lhe boa notícias e abraça-o quando ele se cala – assim, tão logo silenciei, o iluminado espírito de São Pedro abençoou-me volteando três vezes ao meu redor, em atitude de aprovação.”. Configurando sincretismo religioso.
Outra constante é a forma dialogal que a narrativa se desenvolve, há sempre uma questão que Dante deseja formular, na maioria das vezes mediada pelo seu guia Virgílio e também por outros, como a própria Beatriz e respondidas por alguma Eminência do Além.
A Divina Comédia é um clássico por perdurar com qualidade e também por outro motivo, que acreditamos ser de orgulho para os italianos, pois até então os clássicos eram escritos em latim, a exemplo da Eneida do poeta Virgílio ou grego, A Odisseia de Homero e vem Dante Alighieri e escreve essa obra em italiano vulgar, inaugurando, por assim dizer, a escrita de obras de qualidade em outro idioma.
Enfim, ler os Clássicos é beber diretamente nas fontes, isso não tira o mérito da Literatura contemporânea, mas nos torna leitores mais atentos e pouco tendenciosos a pensar que o como se escreve, o que se escreve é novo, pois fazemos um paralelo com o já lido e vemos que beberam nessas antigas e límpidas fontes clássicas. Quem não fica impressionado com a forma brilhante que os russos escrevem, a exemplo de Dostoiévski e também o nosso não menos importante Machado de Assis? Eles provocam e estimulam o leitor, pois veja um exemplo desses recursos na Divina Comédia: “Medita, leitor, nestes prodígios de cuja grandeza antecipei-te algo; pois sei que aprecias a satisfação antes do cansaço. Preparei-te o prato, serve te dele se for de teu agrado.”
Eis o convite!

 Dezembrar, verbalizar e metaforizar

A leitura nos detém nos detalhes, achei linda uma dessas mensagens de bom dia que recebemos no “zapp”, dizia “Dezembre-se para o último mês do ano” É o substantivo dezembro se verbalizando...
E agora que quase estou entrando no Paraíso, claro, do livro A Divina Comédia, encontrei uma metáfora que me encantou, assim como fico encantado com aquelas do Pablo Neruda no livro e no belo filme O Carteiro e o Poeta.
Contextualizemos. Dante, em sua jornada, impossível para os mortais antes da morte, risos, mas com licença especial, pois vai encontrar sua amada Beatriz que no Paraíso está, continua nesse momento acompanhado e tutelado pelo poeta Virgílio e também por outro grande poeta da antiguidade, Estácio. Estão quase chegando ao destino final quando anoitece no finalzinho do Purgatório e Dante sente medo. Aqui vai a metáfora:
“As cabras agilíssimas que, rápidas, velozes, galgam penhascos à procura de pasto, logo depois de saciadas são apenas mansidão e brandura no ruminar demorado, à sombra silenciosa. Vigia-as o pastor diligente, apoiado em cajado que é também o arrimo delas. De seu lado o zagal (ajudante do pastor) que nos plainos pernoita vigilante, junto de seu gado, permanece atento contra assaltos de feras noturnas.
Assim estávamos os três, eu como se fosse a cabra, eles como os pastores – um ao lado do outro, aconchegados sobre a fria rocha,”.
Lindo, em vez de falar diretamente da proteção que teve, metaforizou, meu amigo, talvez querendo dizer desabroche-se verbalizou com um dezembre-se... Assim é a leitura, muitíssimas vezes nos encanta nos detalhes.
Adalto Paceli de Oliveira